Oncoplástica e Expansores de Tecido
Dr. Alexandre Mendonça Munhoz e Dr. Scott Spear (Georgetown University / Washington-DC) no faculty dinner do Congresso Americano de Cirurgia Plástica em Toronto / Canadá. |
Dr. Scott Spear, ex-presidente da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica (ASPS) e chefe do serviço de cirurgia plástica da Georgetown University em Washington/DC e Mark Jewell do Oregon e ex-presidente da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica Estética (ASAPS). No evento o Dr. Alexandre Munhoz proferiu uma palestra sobre os principais aspectos da reconstrução mamária com expansores de tecido, aula esta que colocamos os pontos principais e os mais pertinentes questionamentos em destaque a seguir.
Desta forma, em pacientes na extremidade direita da curva do algoritmo, há uma maior tendência na indicação dos tecidos autógenos (retalhos) uma vez que a expessura do retalhos da mastectomia são insuficientes para uma cobertura adequada, há insuficiência de tecido muscular, a mama contra-lateral é mais volumosa e há algum grau de ptose mamária. Todavia, no extremo esquerdo da curva a mama contra-lateral é de menor volume, há tecido suficiente para uma boa cobertura e com presença de tecido muscular. Assim, seria uma boa indicação para o emprego de expansores de tecido e, no caso específico, a possibilidade de se empregar a técnica do "dual-plane" preconizado pelo grupo de Washington.
- Há relevância na qualidade técnica da cirurgia oncológica no planejamento do expansor ?
- Quais são os principais tipos de expansores de tecidos existentes atualmente?
De maneira geral pode-se dividir os expansores quanto ao seu formato, redondo ou anatômico, quanto a superfície de revestimento, liso ou texturizado e quanto ao sistema valvular, incluso ou remoto. Atualmente e frente as características biomecânicas da expansão mamária há uma tendência maior na utilização dos expansores anatômicos ou chamados de "polo inferior". Este fato deve-se a premissa que a grande maioria das insuficiências cutâneas pós mastectomia são verticais a não horizontais e dessa forma promovendo uma expansão maior do polo inferior da mama consegue-se um resultado mais natural. A superfície texturizada também apresenta benefícios uma vez que promove maior aderência tecidual e evita deslocamento. A válvula inclusa permite um maior conforto na expansão além de reduzir a possibilidade de infecção ou rotação da válvula remota.
É fato atualmente entre todos os cirurgiões habilitados na cirurgia oncoplástica que a integração com a equipe de mastologia é de fundamental importância para o bom resultado final e a ausência de complicações decorrentes da expansão. Segundo Dr. Munhoz "O planejamento das incisões e a margem de ressecção cutânea devem ser apropriadas para a síntese primária do retalho sem tensão na sutura cutânea. Este passo deve ser planejado em conjunto com as duas equipes avaliando-se a segurança oncológica da margem de ressecção e a viabilidade do retalho remanescente".
É consenso também que o retalho remanescente deve-se apresentar de aspecto homogêneo e com perfusão sanguínea adequada em suas bordas. A presença de sinais de isquemia, lesão tecidual macroscópica decorrente de tração excessiva e estase venosa devem ser investigados e uma vez presentes deve-se avaliar a necessidade de debridamento previamente à sutura cutânea sobre o expansor.
Todo mecanismo de expansão desenvolvido no sistema de válvula inclusa é prático e seguro para o cirurgião e confortável para a paciente. Por meio de uma placa magnética, que também protege o expansor de perfurações inadvertidas, consegue-se localizar externamente a região principal para a punção. Por meio de uma sistema simples semelhante à uma bússola delimita-se as coordenadas da placa magnética. Em pacientes magras e com o expansor retromuscular a distância entre a pele é por volta de 1,5 - 2,0 cm e pode ser realizada de maneira segura com uma agulha tipo "scalpe" no. 23. Já em pacientes obesas esta distância pode chegar a 3 - 4 cm e há necessidade de um comprimento maior de agulha como o observado no "jelco" no. 20 ou 22. Calibres maiores podem levar a insuficiência da válvula e perda de volume do expansor.
Dr. Peter Cordeiro, chefe do grupo de cirurgia do Hospital Memorial Sloan-Kettering Cancer Center de Nova York, apresenta hoje uma das maiores casuísticas mundiais na utilização do sistema de expansores anatômicos, texturizados e com válvula inclusa. Segundo Cordeiro, esse sistema é seguro e oferece algumas vantagens em relação aos expansores redondos. Devido a sua conformação, permite uma maior projeção do polo inferior e médio da mama fato este facilita o segundo tempo com simulação de um contorno mais natural da mama.
- Quais são os principais critérios empregados na escolha e inclusão do expansor de tecidos ?
- Existe relevância do índice de massa corpórea ou biotipo da paciente neste planejamento ?
Alguns aspectos são importantes nesta questão e envolve limitações técnicas na execução do procedimento. Em pacientes magras e brevilíneas e a presença de expansores de maior volume, a completa cobertura muscular com os músculos peitoral e serrátil torna-se tecnicamente difícil pela desproporção conteúdo-continente. Nesta situação deve-se atentar para a proteção muscular sobre o expansor nas regiões de maior tensão e na incisão cutânea, regiões estas com maior incidência de erosão e deiscência. Na região do polo inferior da mama, o expansor pode permanecer em posição subcutânea uma vez que esta região apresenta-se bem vascularizada por ramos perfurantes do músculo peitoral maior e reto abdominal, bem como apresenta maior conteúdo de tecido celular subcutâneo.
Esta conduta é adotada de maneira frequente pelo grupo de Washington representado pelo colega Scott Spear o qual preconiza a inclusão do expansor em um plano mixto; submuscular nos 2/3 superiores-mediais e subcutâneo no 1/3 inferior-lateral. Todavia para esta manobra tática é fundamental a espessura e qualidade da pele e tecido subcutâneo na região ínfero-lateral. Nestes casos, a síntese deve ser sempre realizada por planos e de preferência com fios cirúrgicos inabsorvíveis uma vez que a pele e o tecido subcutâneo serão submetidos à tração e os efeitos deletérios da radioterapia complementar. Outro ponto importante está relacionado à incidência de complicações nestas pacientes com maior índice de massa corpórea. Um interessante trabalho publicado em 2008 pelo grupo do Hospital Memorial de Nova York avaliou os fatores preditivos clínicos para complicações pós-operatórias em pacientes submetidas à reconstrução mamária com expansores de tecido texturizados e com válvula inclusa.
Neste estudo, e englobando 1170 reconstruções realizadas em 880 pacientes em 2 anos, os autores observaram que na análise univariada as pacientes obesas (IMC maior que 30) apresentaram maior incidência de complicações que as pacientes não obesas (p<0,002). Neste grupo as obesas apresentaram 2,2 vezes (odds-ratio) mais chances de complicações que as não obesas. No mesmo estudo, além do fator obesidade, as pacientes mais idosas (idade maior que 65 anos), hipertensas e fumantes também apresentaram mais complicações significantivas que as pacientes mais jovens, sem hipertensão e não fumantes. Desta forma torna-se importante uma ponderação na indicação da reconstrução nestes grupos de risco e a individualização das técnicas com objetivo de se minimizar as complicações e os resultados insatisfatórios.
- Que detalhes são importantes no seu posicionamento e o sulco infra-mamário ?
O correto posicionamento do sulco infra-mamário é crucial para a adequada expansão do polo inferior da mama e a correção da insuficiência cutânea vertical. Habitualmente na mastectomia e devido à ressecção cutânea ocorre a subida natural do sulco. Ademais, e visualizando a simetrização há a necessidade de posicionar mais inferiormente o novo sulco infra-mamário. Assim, deve-se posiciona-lo entre 1-3 cm abaixo do sulco original e do sulco contra-lateral. Em mamas sem ptose e que a paciente deseja aumentar a mama contra-lateral esta medida se aproxima de 1 cm. Em mamas maiores e com ptose, o novo sulco pode se posicionar até 3 cm abaixo do sulco original.
- Qual a rotina habitualmente utilizada na expansão pós-operatória ? Quando é o momento oportuno de parar e planejar a 2a. etapa ?
Deve-se atentar, nesta situação, para o edema pós-operatório que pode acentuar a tensão na sutura cutânea nos primeiros dias reduzindo assim a perfusão sanguínea nos retalhos e conseqüentemente advir a isquemia.
- Quais são as características principais do implante-expansor biodimensional ? Este sistema pode ser considerado mais avançado que os expansores convencionais ?
O implante-expansor biodimensional (também conhecido como estilo 150) foi desenvolvido em meados da década de 90 pelo colega americano Patrick Maxwell o qual tivemos a oportunidade de trocar experiências nos dois últimos congressos de cirurgia mamária; Rio de Janeiro/2008 e Atlanta/2009. O sistema apresenta um compartimento anterior constituído por silicone gel coesivo e outro posterior formado por solução salina (soro fisiológico 0,9%). Desta forma existe uma porção estável, não mutável e semelhante aos implantes convencionais, e outra de volume flexível e que pode ser adaptada as diferentes situações durante a evolução do pós-operatório.
Ambos apresenta uma camada Biocell texturizada, formato anatômico biodimensional e a presença da válvula remota. Nas situações de mastectomia com preservação de pele (profilática ou tumores pequenos/carcinoma in situ) tem sua aplicação com vantagens em relação aos demais tipos de implantes. Permite pequenos "ajustes" no decorrer do pós-operatório e em nível ambulatorial além de promover no pós-operatório imediato um sistema de "baixa tensão" no retalho cutâneo remanescente da mastectomia por meio da retirada do volume após a montagem da mama.
Como qualquer técnica cirúrgica, o emprego do implante-expansor apresenta sua indicação precisa na reconstrução da mama pós-mastectomia. Baseado na nossa experiência em mais de 10 anos empregando este tipo de sistema de reconstrução, o implante-expansor apresenta grande utilidade na reconstrução pós cirurgias preservadoras de pele (skin-sparing mastectomy) onde existe o excedente do retalho cutâneo e há a necessidade apenas do preenchimento de volume. Todavia, nessas situações é fundamental a colaboração/cooperação com o mastologista uma vez que a qualidade do retalho da mastectomia é crucial para a indicação do método. O nosso grupo apresenta uma experiência satisfatória no emprego deste sistema nas chamadas "nipple-areola sparing mastectomy" (NAS) onde todo a pele da mama é preservada e retira-se apenas o conteúdo glandular.
Indicado em situações de cirurgias redutoras de risco, tumores in situ, ou tumores pequenos (<2 cm) e distantes da aréola (> 5cm) e reconstrução pós NAS com implante-expanso rem mostrado bons resultados com baixo índice de complicações. Esta experiência inicial foi motivo de uma publicação recente no periódico europeu The Breast onde avaliamos a parte técnica do acesso periareolar com duplo-halo e a reconstrução com o implante-expansor no plano submuscular parcial.
Atualmente questiona-se o papel da radioterapia nos resultados estéticos e na incidência de complicações na reconstrução da mama com expansores/implantes. Todavia, não deve ser considerada como uma contra-indicação absoluta uma vez que o aprimoramento da técnica radioterápica muito evoluiu nos últimos anos. Ademais, com o planejamento computadorizado tridimensional de última geração e o emprego de feixes lineares consegue-se uma maior preservação da pele, tecidos e do próprio expansor e, desta forma reduzindo-se os resultados insatisfatórios. Apesar disto, cada caso deve ser avaliado de maneira individual e em discussão conjunta com o colega mastologista e radioterapeuta com intuito de se conseguir a melhor opção.
Planejamento da radioterapia pós câncer de mama. UCSF, radiation oncology. Cirurgia Oncoplástica. Oncoplastica Surgery. Reconstrução da Mama. |
Em um trabalho publicado pelo colega americano Peter Cordeiro do grupo do Hospital Memorial Sloan-Kettering Cancer Center de Nova York no periódico Plastic and Reconstructive Surgery mostrou claramente a influência da radioterapia na incidência de contratura. Neste estudo, pacientes com história de radioterapia prévia apresentaram aproximadamente uma incidência 4 vezes maior de contratura capsular do que as pacientes sem história de radioterapia. Contabilizando apenas contraturas mais graves (Baker IV), o grupo com radioterapia apresentou incidência de 5,6% e o grupo sem radioterapia de 0,3%.
Setor de Radioterapia do Hospital Sírio-Libanês. Dr. Alexandre Mendonça Munhoz. Cirurgia Oncoplástica. Reconstrução da Mama |
Segundo o Dr. Peter Cordeiro, a contratura é realmente um problema pós radioterapia porém na grande maioria dos casos se apresenta de maneira leve/moderada e tem tratamento efetivo após cirurgia do 2o. tempo da reconstrução com a troca do expansor pelo implante de silicone definitivo. Nesta etapa, Cordeiro enfatiza que é fundamental a capsulotomia ampla da região mamária com liberação de toda fibrose e aderência cicatricial com objetivo de promover o melhor resultado estético. Na nossa experiência, a grande maioria das pacientes realizam a troca do expansor pelo implante após o término da radioterapia e desta forma acreditamos ser mais efetivo a liberação da fibrose e aderências decorrente da contratura capsular.
Em conclusão, a reconstrução mamária pós mastectomia e a aplicação de técnicas/procedimentos oncoplásticos com o emprego de expansores de tecidos posterior troca para os implantes de silicone apresentam sua indicação precisa e tem posição de destaque entre as inúmeras opções de reconstrução. Salientamos que na escolha por esses procedimentos, bons resultados e com um baixo índice de complicações só poderão ser alcançados caso se a indicação para o método e a seleção da paciente forem adequadas e tomadas em conta a espessura do retalho cutâneo remanescente, a adequada cobertura para o expansor e a sinergia de tratamento com equipe multidisciplinar. Nesta edição do Allergan Academy realizada no Brasil em conjunto com a Jornada Paulista de Cirurgia Plástica muitos deste aspectos foram abordados de forma a melhor discutir e elucidar os distintos aspectos da reconstrução da mama com o uso de expansores de tecido.